Eu, Flamboyant

Este texto foi inspirado em uma conversa com Laise Maria, com quem compartilho uma sintonia fina, própria de grandes amigas. A revista Vida Simples também me proporciona algumas momentos interessantes de reflexão. Lá conheci a urna funerária biodegradável produzida por um estúdio de design espanhol. Dentro dela, as cinzas do morto vão se juntar a sementes que irão germinar e formar uma árvore a ser escolhida pelo freguês. Achei bacana a ideia de me transformar num Flamboyant depois de morta. Essa espécie sempre chamou minha atenção. Além de produzir flores de cores entre vermelho, laranja e amarelo, possuem troncos contorcidos, diversificados, como num irreverente balé da vida. Majestosos na sua simplicidade ("se a mulher precisar fazer xixi em pé, que seja com arte", frase do Boca a Boca 2006). Uma esperança concreta de vida após a morte, já que ao nosso corpo deteriorado nunca se ofereceu outra possibilidade a não ser se transformar em um necrochorume poluidor. Poderemos, finalmente, conviver em harmonia: ipês brancos, amarelos, violeta e lilases, quaresmeiras, guapuruvus, entre outras espécies.




"Esse ofício de rabiscar sobre as coisas do tempo exige que prestemos alguma atenção à natureza - essa natureza que não presta atenção em nós. Abrindo a janela matinal, o cronista reparou no firmamento, que seria de uma safira impecável se não houvesse a longa barra de névoa a toldar a linha entre o céu e o chão - névoa baixa e seca, hostil aos aviões. Pousou a vista, depois, nas árvores que algum remoto prefeito deu à rua, e que ainda ninguém se lembrou de arrancar, talvez porque haja outras destruições mais urgentes. Estavam todas verdes, menos uma. Uma que, precisamente, lá está plantada em frente à porta, companheira mais chegada de um homem e sua vida, espécie de anjo vegetal proposto ao seu destino..." (Carlos Drummond de Andrade) 

Na crônica Fala, Amendoeira, acima, o poeta clama: Outonize-se. Embora, na fase atual seja imperativo invernizar-se, melhor, mesmo, é sintonizar-se. Assim a gente se adapta a qualquer estação. É possível apaixonar-se por uma pessoa com a qual não se tem nenhuma afinidade: um ri quando o outro não acha graça, gosta de futebol, enquanto o outro considera esse esporte uma poderosa arma de alienação capitalista; um ajuda animais abandonados, o outro faz piada. Quando um desce, o outro sobe, e vice-versa. Um é livre, o outro, não. Enquanto um assiste a filmes, gosta de rock'n roll e MPB, o outro prefere sertanejas e programas de humor; somente o desejo pode criar sintonia entre pessoas tão diferentes?

Hoje, conversando com um seguidor da doutrina espírita, soube que no mundo espiritual, também é preciso haver sintonia para um ser reconhecer o outro. Ele contou-me sobre uma mãe que afagava o filho sem que ele percebesse esse contato. Detalhe: ambos estavam mortos. Esta semana, foi-se para outra dimensão mais um guaxupeano querido por muitos de nós, André Áccula. Achei que o reencontro dele com outros conterrâneos e boêmios fosse uma consequência natural. Conclusão: haverá luta sempre, mesmo após a morte (partindo de argumentos espiritualistas). Uma flor vermelha pode ser o consolo de um corpo cansado, não enfeitando caixão, nem murcha no chão do cemitério. Mas sendo um convite à vida para aqueles que têm olhos para ver.

"Quando eu morrer, mande flores para o Bradesco, é lá que eu tô enterrado."
(André Áccula - Boca a Boca, 2006)


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Comentários

Unknown disse…
então mande flores pra Receita Federal...é lá que estão tentando me enterrar! kkkkkkkkkkkkkkkk
laliearman disse…
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