Páginas da vida

Conheci Amália na primeira metade da década de 90, quando ela trabalhava na área de comunicação da Abamec, Associação Brasileira dos Analistas de Mercado de Capitais. Eu trabalhava ali perto, no prédio da agência São João do Banco do Brasil. Éramos agitadas como as ruas do centro de São Paulo. Fomos apresentadas por uma amiga em comum que hoje vive na Holanda.
Coincidentemente, ou não, morávamos também na mesma rua. Eu no início da Eça de Queirós e ela no final. Ambas jornalistas, só que ela em atividade e eu bancária atuante. Ela recentemente separada e eu solteira, em plena badalação. As festas e eventos culturais eram nosso ponto de encontro. Nossos sonhos sempre apareciam nas conversas. Da Abamec Amália foi para a revista Carta Capital. De repórter chegou a editora. Decidi correr atrás dos meus sonhos e pedi demissão do Banco do Brasil. Em 1995, o banco incentivou financeiramente demissão voluntária em massa. Eu fui a primeira a entregar o pedido, com carteira de trabalho em punho e todos os documentos exigidos.
Depois de perambular por vários anos, consegui trabalho de repórter fotográfico no jornal carioca Ad Business que abriu filial em Sampa. De lá. fui para a revista Propaganda. Ainda descontente com minha atuação profissional, peguei a rodovia SP/Minas e retornei de mala e cuia à terra natal.
Fui Assessora de imprensa, atriz amadora, fotógrafa, redatora, publicitária, repórter e editora de telejornal, designer gráfico, proprietária de jornal semanal e depois revista mensal. Neste ponto recebi a visita da Amália. Nossos sonhos voltaram a ser temas de conversas. Ela não abandonara a idéia de trabalhar com reciclagem de lixo ou meio ambiente. Ela não tinha nenhum plano claro, tudo ainda estava no campo dos sonhos.
Passado um mês da sua partida, ela me telefonou dizendo que havia sido demitida da Carta Capital. Era isso que ela queria, mas foi pega de surpresa. Passado o susto, reuniu coragem e, em menos de um ano iniciou o projeto da sua vida: a revista Página 22 (informação para um novo século). Atualmente ela anda sem tempo pra me explicar o porquê desse nome, mas acredito que seja porque a linha editorial da revista seja sobre sustentabilidade, questões econômicas e socioambientais, que se não forem abordadas com seriedade, não chegaremos ao século XXII...
E a Página 22 é uma publicação séria. Adoro ler todos os meses suas reportagens, cortesia da editora associada. Amália escreve sobre biocombustíveis, transposição do São Francisco e transgênicos com conhecimento de causa. Está na sua praia, termo válido neste caso, mesmo não havendo mar em São Paulo e a alusão ao Rio...
As entrevistas da Página 22 são reveladoras. Na número 10 achei muito interessante as informações sobre a Interface, fabricante mundial de carpetes, que há mais de 10 anos adotou o conceito da sustentabilidade em todas suas etapas de produção. Contratou até bióloga para compreender melhor a relação dos seus produtos com a natureza. Exemplar.
Na edição 11, que ainda está fresquinha para mim, a seção Retrato descortina a Holanda e como este pequeno país, com a maior parte do seu território abaixo do nível do mar, se protege contra o aquecimento global. Belas paisagens.
Enfim, indico a leitura mensal de Página 22. Amália Safatle ganhou minha admiração há muito tempo, quando se mudou da Vila Mariana pra lá de Cotia, construiu uma casa pré-fabricada e ofereceu abrigo para alguns gatos e cachorros desgarrados. Uma vez, voltando para casa, num congestionamento na Raposo Tavares, viu um cão perdido entre os faróis. Não teve dúvidas, abriu a porta do carro e ele entrou para sua vida.
Eu, jornalista vira-lata, continuo atrás do meu sonho.

(Amelie, ilustração da Luciana Abrão; Rose e Thomaz na Holanda, e Frodo, um cãozinho abandonado que deu sorte)

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