Liesel, Amir e os Animais


Na primeira madrugada de setembro terminei a leitura de A Menina que Roubava Livros, de Markus Zusak. Simplesmente uma história emocionante sobre o poder das palavras e a amizade. As descobertas de uma adolescente na Alemanha nazista durante a 2ª guerra mundial. A história é narrada pela Morte, com toques de ironia: “os humanos são felizes porque podem morrer” ou “me chamam de ceifadora de vidas injustamente, porque só cumpro ordens superiores”, etc. Agora, por mais que se esforce, nunca consegue ser realmente engraçada, principalmente numa época tão vergonhosa para a humanidade.
Parênteses - Adoro passar a mão sobre a capa dos livros e sentir o cheiro do papel. Sou apreciadora da apresentação da Capa. Neste livro, a ilustradora foi muito feliz ao escolher a foto em preto e branco com detalhes em vermelho, a cor do sangue derramado, mas também da paixão e da criatividade.

Alguns meses atrás li O Caçador de Pipas, de Khaled Hosseini, outra obra gostosa de se ler, mas também com verdades tristes de se encarar. A história se passa em Cabul e narra as barbaridades praticadas pelo Taliban contra a dignidade humana e a natureza Divina.
Liesel, a roubadora de livros, aprendeu a ler aos nove anos e, a partir daí, um novo mundo descortinou-se para ela, dando-lhe força e coragem para vencer desafios e ajudar outras pessoas. A menina se assemelha a Amir, o protagonista do drama afegão, que também bebeu na fonte da literatura para sobreviver. Outro ponto em comum nas duas obras é que despertam perplexidade e revolta no leitor. Perplexidade porque mostram culturas distintas e distantes no tempo e espaço: tudo que é diferente causa espanto. E a injustiça gera revolta: “Bem-aventurados os que têm sede e fome de justiça” (Sermão da Montanha – Jesus Cristo).
Em ambos os casos, prepare o lencinho.

Bem-aventurados os misericordiosos

Ser impotente para interferir em situações de injustiça é sensação das mais amargas. Antes de me render à leitura de A Menina que Roubava Livros assisti ao Globo Repórter sobre maus-tratos a animais. Até agora a sensação de impotência amarga minha boca, embora eu participe como voluntária da Associação Protetora dos Animais de Guaxupé. Como fazer justiça em relação aos animais se o homem não é ético nem em relação aos semelhantes? Se a justiça não se aplica à humanidade, como fazê-la com os animais, tão diferentes dos humanos que causam espanto?

Concordo com a Morte: “os seres humanos me assombram”. Ao mesmo tempo em que existem pessoas capazes de arrancar os dentes, dar paulada na cabeça e trancafiar animais em locais exíguos para domesticá-los e, quando não servirem mais às suas necessidades, abandoná-los em qualquer lugar, muitas vezes enjaulados, há pessoas generosas que lutaram pelos seus ideais e venceram, criando um paraíso chamado Rancho dos Gnomos http://www.ranchodosgnomos.org.br/savana/ .

Em Guaxupé, nossa luta é em prol dos cães e gatos abandonados. Mas há uma enorme diversidade de animais pedindo ajuda em silêncio, desde jegues e jumentos trocados pelas motos no nordeste a leões e outros ex-artistas de circo maltratados pelo País. A grande ironia é que vivenciamos uma fase de altas tecnologias, mas o comportamento dos homens continua pré-histórico em muitas questões. Uma infinidade de Pôncios Pilatos lavando as mãos quando deveriam arregaçar as mangas e lutar pela dignidade e honra da humanidade. Por enquanto, o passado e o presente nos condenam. Seremos absolvidos no futuro?

Dica prum domingo feliz: 14h30, Alto-falante, no canal 4, Rede Minas. Entrevista com a trupe de O Teatro Mágico, imperdível.

Na vitrola continuo ouvindo Cassiopéia, da Clara Sandroni.

Frase

"Sempre sejam capazes de sentir profundamente qualquer injustiça praticada contra qualquer pessoa em qualquer parte do mundo. Esta é a qualidade mais linda de um revolucionário."

Che Guevara


(Papuã e Baru, Rancho dos Gnomos)

Comentários

Carolina Zaiat disse…
Sheilitcha,

você conseguiu traduzir todos os meus sentimentos pós Globo Reporter.
Fico sem palavras e profundamente abalada ao ver aquelas imagens dos animais "acabados", tristes, fisicamente e emocionalmente abalados.
É triste, cruel, ridículo.

Nós, seres humanos, iremos pagar por tudo que fizemos e continuamos a fazer.
E não há nada mais justo.

Claro que muitos irão pagar por algo que não cometeram.
Por isso, cabe a nós, seres humanos conscientes, tentarmos pintar com outras cores este triste quadro.

não podemos simplesmente fechar os nossos olhos.
Gostei de quando falou que estamos lavando as mãos, qdo era hora de arregaçarmos as mangas.
ótimo, jornalista.

beijos e saudades

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