duas histórias

O voo de Chico Xavier no 14 Bis

O céu salpicado de nuvens da cena inicial faz uma alusão ao espírito do médium mineiro, desencarnado, alçando voos muito mais altos do que sua humildade permitiu na Terra. Na eleição que a Rede Globo Minas fez durante as comemorações da mudança de século, Chico Xavier foi eleito O Mineiro do Século, superando cientistas, atletas, e escritores, até mesmo Santos Dumont, o inventor do 14 Bis.

Chico Xavier o Filme estreou em 2 de abril, dia em que o médium mineiro completaria 100 anos, e logo tornou-se recordista de público, a maior bilheteria do cinema nacional, desde 95: mais de um milhão e 300 mil espectadores assistiram ao longa nos dez primeiros dias de exibição. Em Guaxupé não foi diferente: de 07 a 11 de maio, cerca de 1.500 pessoas lotaram as poltronas do Cine 14 Bis. Inicialmente, estavam programadas 15 sessões durante uma semana, mas foram estendidas para 30 sessões.
Dirigido por Daniel Filho, o filme foi baseado no livro “As Vidas de Chico Xavier”, de Marcel Souto Maior. Para Sandra Lúcia Furlan Russo, espírita há 22 anos, que esteve na 2ª sessão da última segunda, 10, a versão para o cinema foi fiel à escrita: “O filme mostrou os episódios mais famosos da vida dele.”










O longa retrata uma participação de Chico Xavier em um programa da Rede Tupi. Em dado momento, perguntam a ele se animal tem alma, e o médium afirma que todos os seres vivos possuem espíritos em diferentes estágios de evolução e merecem respeito. Esta é apenas uma das muitas mensagens de generosidade, sabedoria e humildade contidas no longa-metragem.
“O filme não tem o poder de mudar ninguém, mas ele ajuda a despertar a bondade interior de cada um”, afirma o professor Luciano Gonçalves, que é espiritualista, mas não segue nenhuma religião. Já Maria Inês Casagrande acredita que o filme colabora para fortalecer a doutrina espírita: “A essência do espiritismo está na caridade e na simplicidade, e é reconfortante acreditar que a vida não acaba aqui.”
A história de Chico Xavier mostra claramente que existe vida depois da morte. Mas esta questão fica irrelevante se comparada com os valores que ele deixou, de amor, tolerância e bondade. Rafael Diogo Vieira, católico, e Graziela Antunes, evangélica, são casados e convivem bem com suas diferenças. “A igreja é um lugar em que eu me sinto mais perto de Deus”, afirma ele. “O importante é conversar com Deus, cada um faz a sua oração”, diz ela. A vida de Chico Xavier é uma lição de vida para qualquer um, independentemente da opção religiosa.
Vale a pena conferir as brilhantes atuações do menino Matheus Costa, que interpreta o médium na infância, de Ângelo Antônio, na juventude, e de Nelson Xavier, no período maduro. O filme estará em exibição no 14 Bis até a próxima quinta, 20, e há venda antecipada de ingressos.

“Ninguém pode voltar atrás e fazer um novo começo, mas pode recomeçar e fazer uma nova vida.” Chico Xavier








Marcos Paulo e Fernanda, do 14 Bis, informaram que tem havido muita venda antecipada de ingressos.

O casal Urbano e Maria Inês Casagrande, Sandra Lúcia e a neta Kaísa assistiram à 2ª sessão do dia 10.

Rafael, católico, e Graziela, evangélica, aprovaram a oração do médium mineiro.

Luciano Gonçalves e Benedito Barbosa Jr. apreciaram a humildade de Chico Xavier.



Professor Leo, o aventureiro

As aventuras de Eloadir Almeida Vieira, nascido em 28.09.43, em Cabo Verde, foram muitas. Fundador do Correio Sudoeste, em 1973, foi o 1º entrevistado da coluna Minha História, publicada em 01.03 de 2008, onde ele contou como iniciou sua trajetória profissional, de ator de telenovelas em São Paulo, puxador de toras e gado e professor de Inglês, em Goiás, até chegar a diretor do semanário guaxupeano.

Leo morava com os pais no Moçambo, iniciando seus estudos em Guaxupé, entre 1957 e 1962. Em 1965, decidido a se tornar ator profissional, mudou-se para São Paulo, onde estudou artes dramáticas no Teatro Brasileiro de Comédia (TBC). Para ganhar a vida, trabalhou como vendedor de brindes para empresas: “Ia de lambreta, vestido com terno e gravata”.
Naquela época, frequentava o estúdio do Mazzaropi no Largo Paissandu. Chegou a fazer pontas em novelas da Tupi, como Ponte de Waterloo, Presídio de Mulheres, Um segredo na alma de Silvana e na primeira versão de Éramos Seis: “Nunca consegui pegar um papel importante porque não tinha padrinho”. Mesmo assim, o jovem aspirante a galã de cinema participou do filme O pequeno mundo de Marcos, e trabalhou com grandes artistas da época, como Hélio Souto, Noite Ilustrada e Leila Diniz: “Agnaldo Rayol aparecia sempre por lá”. Um sonho não chegou a concretizar: gravar um compacto com 4 músicas da Jovem Guarda.
Em 1967, estressado com o trabalho que sempre acabava de madrugada, colocou o violão embaixo do braço e viajou para o norte de Goiás. “Meu irmão comprou umas terras para plantar arroz, decidi ajudá-lo”. No caminho, em Goiânia, foram assaltados no ônibus. Os ladrões levaram todo o dinheiro que o irmão dele levava pra pagar os 10 lavradores da plantação de arroz. “Tinha até índio trabalhando para ele. Como ficamos sem dinheiro, tivemos que botar a mão na massa. Capinamos arroz até fazer calos nas mãos”.
As noites, às margens da Belém-Brasília, cercados pelo mato, o silêncio era quebrado com os acordes do violão de Leo. Nos fins de semana, frequentavam os bailinhos em Araguaína, Arapoema e Colinas de Goiás.
Com o dinheiro da venda do arroz, compraram um caminhão. “Fomos puxar toras para madeireiras e transportar gado. Um dia, o caminhão atolou e dormimos no meio da mata. Tínhamos um Rifle 44 e uma Winchester 42, para o caso de sermos atacados por algum animal. Sentimos o cheiro de uma onça nos rondando e dormimos os 3 na cabine do caminhão, pois estava muito escuro”, recorda.
Nessa época, ele e o irmão foram viver em Araguaína, entre os rios Tocantins e Araguaia. Leo começou a dar aulas de Inglês, nos intervalos dos carretos, no Ginásio Santa Cruz, para alunos de 5ª a 8ª série. Foi quando conheceu Marizete que cursava a 8ª série: “Tinha encontrado o moço bonito na rua duas vezes, mas ele não me viu”, diz ela. No ginásio, ajudava o professor Leo a passar as notas para os diários de classe. Esse convívio resultou em namoro e posterior casamento, em dezembro de 1970: “O padre era também o diretor da escola”.
Quando o caminhão dos irmãos, dirigido por um motorista contratado por eles, despencou de uma ponte de 10 metros, matando um menino que pegara carona, Eloadir precisou voltar à Guaxupé. Conseguiu dinheiro com o pai para acertar as dívidas. De volta a Araguaína, se casou com Marizete e decidiu retornar de vez à terra natal.
O caminhão, que ficara tombado no rio durante cerca de uma semana, foi retirado e precariamente consertado para a viagem de volta. Os documentos foram perdidos, bem como a capacidade original do motor. Mesmo assim, o casal partiu numa aventura de mais de 1.800 km.
Com pouco dinheiro, as refeições eram preparadas na beira da estrada, onde descansavam em redes dispostas sob as árvores, depois de se banharem nos rios. Sem carteira de motorista, o único documento era uma carta de recomendação do Delegado de Araguaína. Em cada posto policial, Eloadir parava e contava sua história para poder prosseguir. Muitas vezes, pedia ajuda para empurrar o caminhão.

Vida de jornalista
Durante o tempo de professor no Santa Cruz, Eloadir editou também o primeiro jornal da cidade, o Folha de Araguaína. “No museu da cidade, não consta nosso jornal, mas prometi encaminhar um exemplar para eles”. Naquela época, Leo tinha até a 8ª série: “Fui um aventureiro, eu escrevia, mas errava muito”. Dois profissionais ensinaram a ele a arte do ofício: Ariovaldo Argelo, um dos fundadores do Correio Brasiliense, e Roberto Kenjiro, de Campinas.
Nessa época aconteceu um fato curioso: convidado para almoçar com Kenjiro, Leo foi apresentado a um homem chamado Lamarca: “Meu amigo japonês foi cobrir a guerrilha e não voltou mais. Posso ter almoçado com um dos maiores líderes guerrilheiros do país, Carlos Lamarca.”
Em 1971, Leo retomou seus estudos na Academia de Comércio de Guaxupé. Quando começou a redigir um jornal acadêmico, chamou a atenção de dois políticos locais proeminentes. Foi convidado por Ítalo e Walmor Russo, prefeito, a escrever um jornal maior. “Só havia a Folha do Povo, partidária do Dr. Benedito Felipe. O Correio Sudoeste foi patrocinado por um grupo de correligionários do seu Ítalo e do Walmor. Como tivemos grande apoio do comércio, nem precisamos usar o dinheiro oferecido por eles, e ainda sobrou pra me pagar um salário”, afirma.
Depois de muitas cabeçadas, Leo decidiu fazer um pacto com Deus: “Não tínhamos dinheiro para comprar fraldas para Mariléia, nossa primeira filha, que nasceu quando recebi, também, meu primeiro salário”. E Deus aceitou o acordo, pois no nascimento dos outros 4 filhos, Leo teve cada vez mais motivos para comemorar: Lucinéia - compra de máquinas tipográficas para fazer propagandas; Luciano - aquisição de equipamentos para imprimir jornais; Lucimara – torna-se o único proprietário do jornal ao comprar a parte do sócio Ítalo Russo; Eloadir Filho, mudança para sede própria do Correio Sudoeste. “Por mim, tava nascendo filho até hoje”, finaliza.



Em 2006, Leo recebeu o título de Cidadão Guaxupeano indicado pelo vereador Mauri Flório (foto). Após 37 anos dedicados à imprensa guaxupeana, Eloadir faleceu às 6h do dia 11 de maio de 2010, na Santa Casa local, acometido de infarto. Deixou a esposa Marizete, 5 filhos e os netos Romer Filho, Marlon, Letícia e Vinícius.

Entrevista feita em 24.02.2008 e publicada no Correio Sudoeste de 01.03.2008.

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