pra onde foram as baratas?
Há alguns meses venho notando a ausência das baratas, em minha casa e na rua. Não que eu sinta a falta delas, longe disso. Mesmo cuidando de tudo com muito asseio e veneno, até então, minha mãe nunca havia conseguido se ver livre desses insetos, que ocasionalmente nos visitavam, no inverno ou verão. Portanto, esse sumiço é bastante suspeito, principalmente, se estiver acontecendo em toda a cidade - talvez uma ação saneadora do departamento de obras ou alguma substância tóxica lançada nos esgotos ou o preâmbulo de uma invasão de escorpiões ou sob o chão que nos protege, chafurdadas na lama do esgoto, ainda rastejam uma infinidade delas, aliás, os únicos seres vivos que sobreviveriam a uma guerra nuclear - quando meu pensamento chega neste ponto, sempre concluo que a morte, para mim, seria bem mais viável e indolor, pois uma convivência pacífica entre nós seria/é insuportável. E desvio o rumo da prosa.
Infelizmente, parece que até a convivência entre os seres humanos chegou a um ponto insuportável. Os vários aparelhos de TVs ligados em uma mesma casa, onde cada familiar ocupa um cômodo e assiste a um programa diferente (muitas vezes, até, o mesmo) é a prova cabal dessa sentença. Algumas décadas atrás, quando a TV ainda era novidade e o preço não muito atrativo ao bolso da maioria, as pessoas se acotovelavam em salas, portas e janelas para comungarem o mesmo espetáculo, seja a novela, jogo de futebol ou programa de auditório. Imagino que compartilhavam, também, desgostos e alegrias. Havia assunto e, muitas vezes, foguetes, digo, pipoca (a foto tão american way of life, infelizmente, é igualmente representativa para nós, brasileiros).
Atualmente, além de mais individualista, o ser humano está, também, mais perdulário. Até mesmo com a água e energia elétrica, como no pequeno exemplo dos aparelhos de TV. Os discursos politicamente e ambientalmente corretos parecem não chegar aos ouvidos da massa evidentemente catatônica. Como no jornal de hoje, sobre uma passeata no Rio, em que 20 mil manifestantes (avaliação da PM) ou 50 mil (avaliação dos organizadores) ocuparam as ruas em defesa do nosso meio ambiente, respeito aos animais e outros temas relevantes discutidos em torno da conferência mundial Rio + 20. A capital carioca abriga mais de seis milhões de pessoas, só na cidade. Ou seja, enquanto apenas dezenas de milhares se preocupam com o futuro da qualidade de vida no planeta, a maioria recrimina os manifestantes, dizendo que estes atrapalham o trânsito. Na reportagem, um taxista se sente incomodado porque seu passageiro pode não chegar a tempo no aeroporto. É ou não esquizofrenia?
De acordo com uma pesquisa séria, para manter o nível de vida atual, os paulistanos consomem no ano o equivalente a dois planetas Terra e meio. Só nossas metrópoles já justificam a construção da hidrelétrica de Belo Monte e outras adjacentes. Outro exemplo eloquente é que, para sustentar somente o cartão postal que hoje é Tóquio, por causa dos milhares de painéis luminosos que enfeiam, digo, enfeitam a capital japonesa, será necessário reativar a usina nuclear de Fukushima (mesmo com a possibilidade de outras tsunamis). É esse o estilo de vida que pretendemos deixar de herança aos nossos filhos e netos? Seguindo esse raciocínio, como posso confessar que, ainda, meu maior medo é a volta das baratas? Certamente, um enxame delas seria um problema mais fácil de se resolver.
Dica de leitura:
http://www.ofuturoquenosqueremos.org.br/
Hoje, início do inverno, frio, com muita chuva em Guaxupé.
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