casa da vó maria
Lorice Cury Saad, personagem da coluna Minha História do fim de semana anterior, é carnavalesca desde os memoráveis carnavais de outrora, iniciados nos últimos anos da década de 1940, e autora do samba-enredo, de 2010, do Viralatas do Samba. Desfilou com este bloco na avenida, na última segunda, 7, debaixo de uma chuvinha persistente. Ela é uma das guerreiras que luta pela valorização da identidade do carnaval de Guaxupé, sua terra natal. É, realmente, uma cidadã: ama esta cidade de forma genuína, sem interesses políticos.
Por ter uma alma poética, em alguns pontos, Lorice concorda com o jornalista Rodrigo Sá:
“A chuva de sábado à noite não era apenas uma chuva, era o céu chorando, retratando toda a tristeza do povo guaxupeano, que só queria um pouco de alegria e felicidade durante esta que é uma das festas mais populares do nosso país. Ficamos isolados na nossa região. Uma cidade-fantasma, triste, escura e chuvosa em meio a um mar de vida, alegria e celebração em tantas outras cidades que nos circundam. E que já bateram muitas palmas para esta cidade que já ostentou por muito tempo o orgulho de ter um dos melhores carnavais do interior de Minas Gerais.”
Leia este texto na íntegra, no Portal GXP: http://www.gxp.com.br/2011/03/06/carnaval-de-guaxupe-quem-te-viu-quem-te-ve/
Mas tenho que discordar de outros pontos de vista. Desde sexta-feira (até mesmo durante os ensaios iniciados em janeiro deste ano) a cidade não estava nada fantasma, tampouco triste e escura para quem esteve na Casa da Vó Maria, que virou um mar de vida, alegria e celebração durante os dias de folia. Ainda, com direito à música popular, jazz e rock’n’roll. Pena que vocês não estiveram junto, Rodrigo (e Carol!) e Miguezinho.
(leia comentário escrito por Rodrigo Sá, no final desta postagem)
O local bombou de alegria. Tanto que a PM foi acionada pelos vizinhos, incomodados com o som da nossa bateria. Lembrando que a casa está localizada no coração da cidade, ao lado da avenida onde acontecem os desfiles. Será que o som incomodava, realmente, tanto assim, ou a reclamação vem de pessoas que não suportam carnaval ou a felicidade alheia? E olha que a bateria tocou, acompanhada de vozes e cavacos, somente das 22h às 23h.
Sem sombra de dúvida, as próximas fotos ratificam minhas palavras. Excetuando o Clube Guaxupé, a Casa da Vó Maria foi o único bastião em prol do carnaval da cidade, um farol em meio à escuridão. Tanto que juntou diversas tribos, alguns motivados a curtir o momento na sua terrinha e outros, de Passos, Poços ou São Paulo, motivados a conhecer novas culturas e amigos. Foram momentos prazerosos. Uma realização de sucesso da Associação Viralatas do Samba, fundada há menos de um ano. A diretoria, da qual sou presidente, acredita que fomentar a continuidade do bloco de rua Viralatas do Samba seja uma contribuição importante para a cidade. Não só em prol do prestígio do carnaval de Guaxupé, mas um outro tipo de incentivo à socialização através da música, da arte e da preservação da cultura local.
Madrugada de cinzas...
Infelizmente, nosso bloco não foi pra rua no sábado, 5, como estava agendado. A chuva começou na segunda, 28, parando somente na Quarta de Cinzas. A temperatura também contribuiu para esfriar os ânimos. Assisti aos desfiles dos blocos, no domingo: Bloco do Espaço, Fênix e Unidos das Vilas. Foi emocionante constatar a garra dos profissionais que trabalham com carnaval em Guaxupé (Não se espante, é trabalho, sim). Pois existe uma organização intensa até o momento do desfile na rua. E, depois de muito suor, desfilar para pouquíssimas pessoas, deveria ser, no mínimo, desestimulante. Ainda, o aparente pouco caso da imprensa e da Prefeitura quanto aos desfiles carnavalescos, nas matérias que antecederam o carnaval deveria ter contribuído, ainda mais, para a queda do tesão (por parte de ambos, faltou material de divulgação e de valorização dos desfiles dos blocos e escolas). Mesmo assim, aconteceu o imprevisível.
Estes dois jovens chineses moram nos fundos da Pastelaria Hong Kong, no antigo local do Bar Galo de Ouro, na Conde Ribeiro do Valle, bastante corrido durantes os desfiles de outrora. Sábado, estava tudo vazio, com moradores de uma cultura totalmente diferente da nossa. Fiquei curiosa para saber a impressão deles sobre nosso carnaval. Quais serão as expectativas destes novos habitantes, silenciosos, da cidade...
O Viralatas do Samba desfilou na segunda, debaixo de uma chuvinha chata. Foi precedido pela turminha da Casa da Criança (parabéns pelo samba, Romeu Magno!) e sucedida pelo Feijão Queimado, com seus belos "césares" e "cleópatras" idealizados pela Bia Melo e Nenê Granjeiro. Não houve o que ou quem arrefecesse os ânimos da moçada, que queria, literalmente, botar o bloco na rua (quando digo moçada, entenda-se todos os integrantes do bloco, bateria e foliões). E foi positiva a receptividade das poucas pessoas que prestigiaram nosso desfile. Chegaram a demonstrar reação, cantando trechos dos sambas: "Quero cantar, oba! Quero sambar, oba! Sou Viralatas, sou carnaval".
Foi uma pena não ter havido investimento em arquibancadas cobertas para o público, em enfeites e iluminação de rua. Ano passado, falaram até em colocar caixas de som em diversos trechos para abolir o trio-elétrico - que por sinal soltava uma fumaça preta que, momentaneamente, afetou a saúde de quem desfilou ao lado. Desta forma, a avenida virou um cenário macabro devido à ocasião. A chuva não teria causado tanto estrago se houvesse planejamento e boa vontade, olho vivo!
Fotos do desfile do Viralatas: André Monteiro Leonel (aliás, muitas fotos vêm, direta ou indiretamente, da mesma família, valeu!)
Este acontecimento vêm corroborar, ainda mais, minha tese de que deve ser investido mais dinheiro nos desfiles de rua dos blocos e escolas de samba (parceria entre público e privado, por exemplo). Esta poderia ser a tão procurada identidade do carnaval de Guaxupé. Outrora, havia os blocos e foliões fantasiados, no Clube Guaxupé, do esculachado ao luxo, do Arrazzo ao SculaXado (desculpem-me, mas esqueci a ortografia correta). Por que não criar novos desfiles, novas tribos, mas na rua? Inexoravelmente, o mundo gira e, neste movimento, se transforma. Se hoje em dia o povo não curte mais carnavais de salão, "a César o que é de César", mas sem pão e circo. Não é correto falar que o povo quer axé se ele não é estimulado a abraçar novas opções (Abraça, viralatas!). E Guaxupé tem que ser uma opção diferente de Muzambinho e Guaranésia, exemplo de carnavais de sucesso, promovidos por particulares e administração pública. Para as cidades conviverem em harmonia, nesta época, é preciso adotar estilos diferentes, oferecer opções para gostos variados. Acho que a pista para todo mundo sair ganhando é por aí...
Os Viralatas gostariam de se apresentar novamente, no próximo sábado, 12, junto com todos os cinco grupos que desfilaram neste carnaval. Seria uma maneira inovadora, por aqui, de contornar as intempéries, como a chuva que atrapalhou (em termos) os desfiles. Seria uma forma, também, de a Prefeitura mostrar à uma parcela maior da população onde foram aplicados os 65 mil reais destinados aos blocos e escolas. E, ainda, de reconhecimento ao esforço de todos os carnavalescos, que contribuíram de modo exemplar para que o carnaval de 2011 não fosse totalmente perdido.
Parabéns a todos os Viralatas, especialmente, à diretoria da Associação pelo trabalho desenvolvido, também, dentro da Casa da Vó Maria, que não foi pouco. E palmas para a bateria comandada pelo Luís Paulo Ferreira. Valeu!
É MAIS FÁCIL CRITICAR DO QUE FAZER.
MINHA HISTÓRIA
Menestrel em meio à globalização
Lorice Cury Saad nasceu em 25.10.26, em Guaxupé, a primogênita de Elias Cury e Lidia Sabbag Cury, ambos imigrantes sírio-libaneses. Desde pequena, esteve envolvida com temas relacionados às artes, seja declamando, na escola, ou fazendo arte, como toda criança inventiva. Como escritora amadora, colaborou com diversas publicações da cidade e, como carnavalesca, foi integrante da Escola de Samba Os Bicancas. É autora da letra do samba-enredo, deste ano, do Viralatas do Samba. Com alegria genuína, é uma carnavalesca cantante, um menestrel em tempos globalizados.
“Meus pais se casaram em São Paulo. Logo, vieram para Guaxupé morar com meus avós paternos, Padre José Elias e Futina, na casa onde nasci, na Praça do Rosário. Quando meu irmão Kaled nasceu, dois anos depois, já morávamos na Rua Aparecida, onde nasceu meu segundo irmão, José.
Por volta dos meus sete anos, nos mudamos para uma casa próxima à Igreja Ortodoxa. Eu queria brincar na rua, mas mamãe me obrigava a embalar Fátima, minha irmã recém-nascida, num berço de balanço. Do quarto ouvia mamãe cantando, em árabe, enquanto passava roupas. Eram cantos tristes, que me faziam chorar ainda mais por não poder brincar como queria.
Meus irmãos eram coroinhas da igreja. As missas eram cantadas. Como papai também tinha uma voz muito bonita, ajudava o padre, seu pai, a celebrá-las. Ele tinha uma loja de brinquedos, onde atualmente é a Pé Jovem. Vez ou outra, me levava junto em seu Fordão. Um dia, me deixou dentro do carro, na porta da loja, mas não puxou direito o freio de mão e o carro começou a descer a rua. Eu despenquei a gritar. Daí, Merxedez Mussi, que estava na esquina, me socorreu, pulando no estribo e puxando o freio.
Nessa época, comecei a estudar no Colégio Imaculada Conceição. Matei muita aula para roubar goiabas com uma turma de colegas. As freiras tinham uma grande chácara nos fundos da escola, que terminava na Avenida Dr. João Carlos. Uma tábua larga passava sobre um córrego, dando acesso à rua.
Fiquei no Colégio até o 3º ano. As freiras queriam que eu freqüentasse as confissões, missas e procissões. Como meu pai era filho de padre, de outra religião, não concordou com estas exigências. Terminei o primário no Grupo Barão, em 1936, no prédio onde, posteriormente, funcionou o extinto Hotel Central.
Mineirinha na cidade grande
No ano seguinte, papai recebeu uma proposta do seu irmão, Alfredo, para ser sócio dele num bar da Avenida São João. Como os negócios daqui não iam bem, passou a loja pra frente e nos mudamos para São Paulo, onde nasceu minha irmã caçula, Nádia.
Inicialmente, ficamos hospedados na casa do tio Abrão, irmão da mamãe. Depois, papai alugou uma casa na Dona Avelina, uma rua íngreme, de terra. No final dela, havia uma mina d’água, onde eu buscava água com tia Halul. Levava um jarro pequeno, enquanto ela enchia uma lata de 18 litros que carregava nos ombros.
Nessa casa, fiz uma ‘arte’ que me rendeu um desvio na espinha. Aproveitei a ausência dos meus pais para brincar de balanço no varal de roupas. Subi em cima da nossa mesa de refeições, situada numa área externa, ao lado da cozinha, e pulei. O varal arrebentou, pois não aguentou meu peso. Ao cair de costas, fiquei até sem ar. Mas mamãe nunca soube do acontecido.
Logo, nos mudamos para a Rua Neto de Araújo, também na Vila Mariana. Gostava muito de ler, principalmente, revistas em quadrinhos. Uma vizinha tinha uma grande biblioteca e me emprestava os livros infantis da Coleção Melhoramentos.
Nesta casa, havia uma despensa. A janela descortinava uma ampla paisagem urbana. Dali, costumava fazer reflexos no ar com um pedaço de espelho. De um ponto desconhecido, alguém me respondia da mesma forma. Fiz isto muito tempo, tentando adivinhar quem era a pessoa do outro lado.
Fui estudar no Colégio Oriental, numa travessa da Avenida Paulista. Papai conhecia Salomão Yázigi, o diretor, com quem fez um acordo: se conseguisse dois alunos para a escola, recém-criada, eu poderia estudar de graça. E assim foi.
Fiz um ano de admissão e entrei para o 1º ano, que repeti por causa do Francês. No 2º ano, fui a melhor aluna da classe nessa matéria. Como eu era ruiva, meus colegas me apelidaram de cebolinha por causa das minhas tranças vermelhas.
O diretor era muito rigoroso, nenhum aluno gostava dele. Uma vez, bateu várias vezes com a régua em minhas mãos porque me encontrou fora da carteira, na sala de aula. Expliquei que levantei para pegar de volta a borracha que havia emprestado para um colega, mas não escapei do castigo.
A escola funcionava como semi-internato, mas eu almoçava em casa. Ia e voltava de bonde. À tarde tinha aulas de Árabe, junto com alunos de diversas idades. Coincidentemente, um aluno tinha o mesmo nome do meu irmão: Kaled Cury. Era boxeador. Um dia, seo Salomão, também professor de Árabe, ofendeu, verbalmente, este meu colega, que revidou com um murro na cara dele. Foi expulso da escola. Por falar em Árabe fluentemente, o diretor passou a me ver com mais simpatia.
O Parque Trianon, próximo à escola, estava sendo construído. Com meus colegas, Ayda Smit e Fuad Sawaya, eu matava aulas, à tarde, para subir numas pedras enormes usadas nesta construção. Também, ia às matinês do Cine Paraíso, adorava os filmes do Flash Gordon.
Uma vez, durante um almoço, caiu um mosquito no meu prato de sopa. Mamãe retirou o inseto e disse para eu continuar comendo. Como não obedeci, ela guardou a comida no prato, para o jantar. Só comi no almoço do dia seguinte, pois não agüentava mais de fome. Por ser a mais velha, mamãe foi muito rígida comigo.
Além do bar, papai vendia gravatas para as Casas Minerva, no Largo do Tesouro (depois, Largo do Correio). Em casa, mamãe cortava e costurava essas gravatas. Mas papai se desentendeu com o irmão, viciado em jogos, e decidiu vender o bar. Retornamos à casa dos meus avós, em 1941.
De volta às origens
Todas as tardes, no alpendre da casa, vovô costumava fazer aperitivos, geralmente, uma dose de pinga acompanhada de carne crua. Enquanto isto, minhas primas e eu ficávamos cantando em cima dos pés de caqui, no pomar do nosso avô. Também acompanhava meus irmãos para todo lado. Brincava com eles no Rio Guaxupé, no Bebedouro, e empinava pipas.
Depois, nos mudamos para a Avenida Conde Ribeiro do Valle, numa casa que tinha o chão de tábuas lavadas e fogão à lenha. O depósito de lenha ficava no porão. Com o tempo, apareceram fissuras no piso da casa. Por ali, começaram a entrar insetos e filhotes de cobras. No fundo do quintal, onde papai plantava muito milho, havia um brejo, formado por causa de um desvio que fizeram no percurso do Rio Guaxupé.
Fiz o propedêutico e o curso Técnico em Contabilidade na Academia de Comércio São José. Tinha apenas duas colegas, Lusbelina Alves e Maria da Glória, os demais eram homens. Lembro-me, com saudades, dos professores João Cândido, Dr. Artur Leão, Almo Saturnino e do sempre tão compreensivo seo Totó Eclissato.
Estava no 2º ano técnico quando representei a Academia no concurso de Rainha dos Estudantes. Heloísa Zerbini representou o Ginásio. Após a eleição haveria um baile. Na hora de conferir os votos, aconteceu um bafafá, uma briga muito feia que acabou com o meu sonho de ser rainha dos estudantes e com a festa.
Em 1944, recebi o diploma. Meu avô viajava pelo Brasil para celebrar batizados e missas. Voltava com muitos cortes de tecido que ganhava e dava de presente para as filhas e netas. Minhas tias, Fádua e Angelina, fizeram um vestido lindo para eu usar no baile de formatura. Estava quase pronto quando souberam que Tereza Buffoni, convidada para dançar a valsa com um dos formandos, havia feito um modelo igual. Fizeram outro, às pressas, para mim. Também ficou lindo, foi uma noite maravilhosa.
Quando me formei, seo Ítalo Russo me convidou para trabalhar no escritório da Papelaria Brasília. Um dia, chegando do trabalho, ouvi uma música. Quase desmaiei de felicidade quando entrei em casa e vi um rádio, meu sonho de consumo. Passei a ouvir música até altas horas, mesmo com as broncas da minha mãe.
Aprendi muito nesse escritório, mas fiquei poucos meses, pois mamãe adoeceu e precisei deixar o trabalho para ajudar em casa. Fiz amizade com Dirce Matos, grande e saudosa amiga, e Walquíria Russo, todas as duas minhas colegas na papelaria. Nós três fomos as primeiras mulheres a usar calças compridas em Guaxupé, num baile de Carnaval. Papai nunca soube deste fato, era muito rigoroso com os filhos. Mamãe era joia, acobertava a gente quando ele viajava a trabalho.
Minhas tias me ensinaram a bordar. Bordei muito para fora, fazendo crivo e sutache. Consegui juntar um bom dinheirinho, que emprestei ao papai. Ele só melhorou de vida ao começar a vender, na região, as Balas Imperial, fabricadas em Uberlândia: Eram uma delícia.
Um tempo depois, tio Jacob Sabbag pediu que papai me deixasse trabalhar, provisoriamente, no caixa do Bazar Avenida, em substituição a uma funcionária. Fiquei mais de um ano nesta função. Quando saiu a nota de mil cruzeiros, muito parecida com a de cem, cometi um equívoco: troquei uma pela outra, ao dar um troco. Tio Jacob foi muito compreensivo comigo, pois eu não tinha como pagar o prejuízo.
Namoro, batuques e casamento
Era muito amiga da Genoveva Saad. Por este motivo, fiz, também, amizade com o irmão dela, Sadalla. Em 1946, começamos a namorar. Íamos muito a bailes, gostávamos de dançar. Habitualmente, namorava dentro de casa. Quando ele começou um bloco de carnaval de rua com cerca de vinte amigos, entre eles, meu irmão Kaká, em 1947, juntei-me ao grupo. Havia somente três mulheres.
Por sugestão do meu irmão, o bloco foi batizado de Os Bicancas porque todos os componentes tinham narigões. O desenho do estandarte foi inspirado no Fadinho, um amigo do Sadalla, muito narigudo.
Ficamos noivos, em 49, nos casamos, em 1951. Em homenagem ao meu avô, já adoentado nessa época, vieram um bispo e um vice, de São Paulo, para celebrar nosso casamento, na Igreja Ortodoxa. Após nossa lua de mel, em Poços de Caldas, fomos morar com meus sogros.
Em 1952, nasceu nosso primogênito, Marcos Antônio. No ano seguinte, nos mudamos para uma casa na Rua Aparecida. Em 1956, nasceu nossa filha, Lidia Maria. Foi uma época muito boa. Aconteciam muitas festas na nossa casa, com muito samba e batuque. Nossos primos vinham de São Paulo para brincar os carnavais. Meu marido comprava caixas de lança-perfume Rodouro, que a gente espirrava uns nos outros.
Fui convidada para ser uma das ‘10 mais elegantes’ em um baile do Clube Guaxupé. Lula Thomaz fez parte da comissão que foi até minha casa fazer o convite. Também, tínhamos mesa cativa no Clube. Quando Isaac Elias foi presidente, ganhei um diploma de foliã mais animada e um prêmio em dinheiro. Desde 1965, quando nasceu nossa caçula, Sheila, já morávamos em casa própria, construída na Praça do Rosário, em frente à casa dos meus pais.
Com o passar dos anos, nosso bloco virou escola de samba. Chegou a ter mais de trezentos integrantes, a bateria, mais de cem. Nádia era porta-bandeira e Jorge Abrão, mestre-sala. Os Bicancas desfilaram e fizeram pré-carnavais em algumas cidades da região, como Poços de Caldas e São João da Boa Vista.
Uma vez, ao descer do ônibus, tropecei, e uma mulher que nos observava, falou: já chegou bebum. Logo eu, que não bebia nada. Noutra feita, pisei no arco da fantasia e caí, ficando com as pernas para cima. Meu sobrinho, Wagner, me ajudou a levantar. Foi um vexame, nunca mais quis usar arcos. Desfilamos, pela última vez, em 1981.
Fiz várias excursões, para a Pousada do Rio Quente, Salvador, Sul do Brasil e Madrid, na Espanha. Passamos vários carnavais no Rio de Janeiro, em excursões com o amigo André Calicchio. Numa destas viagens, Nádia, Lidia Maria, Marília Gonçalves e eu desfilamos na Unidos da Tijuca. Foi uma realização.
Participei muito da vida escolar dos meus filhos, estudava com eles para as provas. Também, sempre gostei de escrever. Colaborei com os jornais Coreto e Atitude. Escrevi crônicas para 23 edições da revista Atitude Interior.
Um dos meus maiores prazeres é caminhar, comecei há mais de quarenta anos. Apanhei muita chuva, caminhando. Até hoje, caminho por uma hora com minha filha caçula. Meu passatempo é fazer palavras cruzadas e ler romances. Ainda, participo do Viralatas do Samba, não posso deixar a peteca cair.”
Este vai ser o quarto ano da Lorice com o Viralatas do Samba. Muito participativa, faz sugestões para as fantasias e colabora na confecção dos adereços. Foi grande fonte de inspiração para o desfile de 2011. Ainda, ajuda sua filha na revisão desta coluna semanal com dicas preciosas. Sua força e alegria são um grande exemplo para toda a família: tem seis netos, mais Manuela e João Lucas, bisnetos.
Fotos:
1) Lorice no baile de formatura da Academia, em 1944.
2) Lorice e Sadalla Saad: casamento em 08.10 de 1951.
3) No carnaval de Os Bicancas, em 77, com a fantasia Sacerdotisa do Templo.
4) Em 2001, Lorice, entre os filhos Lidia Maria, Sheila e Marcos.
5) Recentemente, com as irmãs, Nádia e Fátima.
6) No desfile da Unidos da Tijuca, no Rio, em 1995.
Patrocínio Minha História:
Desculpe, caro leitor (a), pelo atraso, mas o trabalho foi grande, nas últimas semanas, E a ressaca, enooorme!
Por ter uma alma poética, em alguns pontos, Lorice concorda com o jornalista Rodrigo Sá:
“A chuva de sábado à noite não era apenas uma chuva, era o céu chorando, retratando toda a tristeza do povo guaxupeano, que só queria um pouco de alegria e felicidade durante esta que é uma das festas mais populares do nosso país. Ficamos isolados na nossa região. Uma cidade-fantasma, triste, escura e chuvosa em meio a um mar de vida, alegria e celebração em tantas outras cidades que nos circundam. E que já bateram muitas palmas para esta cidade que já ostentou por muito tempo o orgulho de ter um dos melhores carnavais do interior de Minas Gerais.”
Leia este texto na íntegra, no Portal GXP: http://www.gxp.com.br/2011/03/06/carnaval-de-guaxupe-quem-te-viu-quem-te-ve/
Mas tenho que discordar de outros pontos de vista. Desde sexta-feira (até mesmo durante os ensaios iniciados em janeiro deste ano) a cidade não estava nada fantasma, tampouco triste e escura para quem esteve na Casa da Vó Maria, que virou um mar de vida, alegria e celebração durante os dias de folia. Ainda, com direito à música popular, jazz e rock’n’roll. Pena que vocês não estiveram junto, Rodrigo (e Carol!) e Miguezinho.
(leia comentário escrito por Rodrigo Sá, no final desta postagem)
O local bombou de alegria. Tanto que a PM foi acionada pelos vizinhos, incomodados com o som da nossa bateria. Lembrando que a casa está localizada no coração da cidade, ao lado da avenida onde acontecem os desfiles. Será que o som incomodava, realmente, tanto assim, ou a reclamação vem de pessoas que não suportam carnaval ou a felicidade alheia? E olha que a bateria tocou, acompanhada de vozes e cavacos, somente das 22h às 23h.
Sem sombra de dúvida, as próximas fotos ratificam minhas palavras. Excetuando o Clube Guaxupé, a Casa da Vó Maria foi o único bastião em prol do carnaval da cidade, um farol em meio à escuridão. Tanto que juntou diversas tribos, alguns motivados a curtir o momento na sua terrinha e outros, de Passos, Poços ou São Paulo, motivados a conhecer novas culturas e amigos. Foram momentos prazerosos. Uma realização de sucesso da Associação Viralatas do Samba, fundada há menos de um ano. A diretoria, da qual sou presidente, acredita que fomentar a continuidade do bloco de rua Viralatas do Samba seja uma contribuição importante para a cidade. Não só em prol do prestígio do carnaval de Guaxupé, mas um outro tipo de incentivo à socialização através da música, da arte e da preservação da cultura local.
Madrugada de cinzas...
Infelizmente, nosso bloco não foi pra rua no sábado, 5, como estava agendado. A chuva começou na segunda, 28, parando somente na Quarta de Cinzas. A temperatura também contribuiu para esfriar os ânimos. Assisti aos desfiles dos blocos, no domingo: Bloco do Espaço, Fênix e Unidos das Vilas. Foi emocionante constatar a garra dos profissionais que trabalham com carnaval em Guaxupé (Não se espante, é trabalho, sim). Pois existe uma organização intensa até o momento do desfile na rua. E, depois de muito suor, desfilar para pouquíssimas pessoas, deveria ser, no mínimo, desestimulante. Ainda, o aparente pouco caso da imprensa e da Prefeitura quanto aos desfiles carnavalescos, nas matérias que antecederam o carnaval deveria ter contribuído, ainda mais, para a queda do tesão (por parte de ambos, faltou material de divulgação e de valorização dos desfiles dos blocos e escolas). Mesmo assim, aconteceu o imprevisível.
Estes dois jovens chineses moram nos fundos da Pastelaria Hong Kong, no antigo local do Bar Galo de Ouro, na Conde Ribeiro do Valle, bastante corrido durantes os desfiles de outrora. Sábado, estava tudo vazio, com moradores de uma cultura totalmente diferente da nossa. Fiquei curiosa para saber a impressão deles sobre nosso carnaval. Quais serão as expectativas destes novos habitantes, silenciosos, da cidade...
O Viralatas do Samba desfilou na segunda, debaixo de uma chuvinha chata. Foi precedido pela turminha da Casa da Criança (parabéns pelo samba, Romeu Magno!) e sucedida pelo Feijão Queimado, com seus belos "césares" e "cleópatras" idealizados pela Bia Melo e Nenê Granjeiro. Não houve o que ou quem arrefecesse os ânimos da moçada, que queria, literalmente, botar o bloco na rua (quando digo moçada, entenda-se todos os integrantes do bloco, bateria e foliões). E foi positiva a receptividade das poucas pessoas que prestigiaram nosso desfile. Chegaram a demonstrar reação, cantando trechos dos sambas: "Quero cantar, oba! Quero sambar, oba! Sou Viralatas, sou carnaval".
Foi uma pena não ter havido investimento em arquibancadas cobertas para o público, em enfeites e iluminação de rua. Ano passado, falaram até em colocar caixas de som em diversos trechos para abolir o trio-elétrico - que por sinal soltava uma fumaça preta que, momentaneamente, afetou a saúde de quem desfilou ao lado. Desta forma, a avenida virou um cenário macabro devido à ocasião. A chuva não teria causado tanto estrago se houvesse planejamento e boa vontade, olho vivo!
Fotos do desfile do Viralatas: André Monteiro Leonel (aliás, muitas fotos vêm, direta ou indiretamente, da mesma família, valeu!)
Este acontecimento vêm corroborar, ainda mais, minha tese de que deve ser investido mais dinheiro nos desfiles de rua dos blocos e escolas de samba (parceria entre público e privado, por exemplo). Esta poderia ser a tão procurada identidade do carnaval de Guaxupé. Outrora, havia os blocos e foliões fantasiados, no Clube Guaxupé, do esculachado ao luxo, do Arrazzo ao SculaXado (desculpem-me, mas esqueci a ortografia correta). Por que não criar novos desfiles, novas tribos, mas na rua? Inexoravelmente, o mundo gira e, neste movimento, se transforma. Se hoje em dia o povo não curte mais carnavais de salão, "a César o que é de César", mas sem pão e circo. Não é correto falar que o povo quer axé se ele não é estimulado a abraçar novas opções (Abraça, viralatas!). E Guaxupé tem que ser uma opção diferente de Muzambinho e Guaranésia, exemplo de carnavais de sucesso, promovidos por particulares e administração pública. Para as cidades conviverem em harmonia, nesta época, é preciso adotar estilos diferentes, oferecer opções para gostos variados. Acho que a pista para todo mundo sair ganhando é por aí...
Os Viralatas gostariam de se apresentar novamente, no próximo sábado, 12, junto com todos os cinco grupos que desfilaram neste carnaval. Seria uma maneira inovadora, por aqui, de contornar as intempéries, como a chuva que atrapalhou (em termos) os desfiles. Seria uma forma, também, de a Prefeitura mostrar à uma parcela maior da população onde foram aplicados os 65 mil reais destinados aos blocos e escolas. E, ainda, de reconhecimento ao esforço de todos os carnavalescos, que contribuíram de modo exemplar para que o carnaval de 2011 não fosse totalmente perdido.
Parabéns a todos os Viralatas, especialmente, à diretoria da Associação pelo trabalho desenvolvido, também, dentro da Casa da Vó Maria, que não foi pouco. E palmas para a bateria comandada pelo Luís Paulo Ferreira. Valeu!
É MAIS FÁCIL CRITICAR DO QUE FAZER.
MINHA HISTÓRIA
Menestrel em meio à globalização
Lorice Cury Saad nasceu em 25.10.26, em Guaxupé, a primogênita de Elias Cury e Lidia Sabbag Cury, ambos imigrantes sírio-libaneses. Desde pequena, esteve envolvida com temas relacionados às artes, seja declamando, na escola, ou fazendo arte, como toda criança inventiva. Como escritora amadora, colaborou com diversas publicações da cidade e, como carnavalesca, foi integrante da Escola de Samba Os Bicancas. É autora da letra do samba-enredo, deste ano, do Viralatas do Samba. Com alegria genuína, é uma carnavalesca cantante, um menestrel em tempos globalizados.
“Meus pais se casaram em São Paulo. Logo, vieram para Guaxupé morar com meus avós paternos, Padre José Elias e Futina, na casa onde nasci, na Praça do Rosário. Quando meu irmão Kaled nasceu, dois anos depois, já morávamos na Rua Aparecida, onde nasceu meu segundo irmão, José.
Por volta dos meus sete anos, nos mudamos para uma casa próxima à Igreja Ortodoxa. Eu queria brincar na rua, mas mamãe me obrigava a embalar Fátima, minha irmã recém-nascida, num berço de balanço. Do quarto ouvia mamãe cantando, em árabe, enquanto passava roupas. Eram cantos tristes, que me faziam chorar ainda mais por não poder brincar como queria.
Meus irmãos eram coroinhas da igreja. As missas eram cantadas. Como papai também tinha uma voz muito bonita, ajudava o padre, seu pai, a celebrá-las. Ele tinha uma loja de brinquedos, onde atualmente é a Pé Jovem. Vez ou outra, me levava junto em seu Fordão. Um dia, me deixou dentro do carro, na porta da loja, mas não puxou direito o freio de mão e o carro começou a descer a rua. Eu despenquei a gritar. Daí, Merxedez Mussi, que estava na esquina, me socorreu, pulando no estribo e puxando o freio.
Nessa época, comecei a estudar no Colégio Imaculada Conceição. Matei muita aula para roubar goiabas com uma turma de colegas. As freiras tinham uma grande chácara nos fundos da escola, que terminava na Avenida Dr. João Carlos. Uma tábua larga passava sobre um córrego, dando acesso à rua.
Fiquei no Colégio até o 3º ano. As freiras queriam que eu freqüentasse as confissões, missas e procissões. Como meu pai era filho de padre, de outra religião, não concordou com estas exigências. Terminei o primário no Grupo Barão, em 1936, no prédio onde, posteriormente, funcionou o extinto Hotel Central.
Mineirinha na cidade grande
No ano seguinte, papai recebeu uma proposta do seu irmão, Alfredo, para ser sócio dele num bar da Avenida São João. Como os negócios daqui não iam bem, passou a loja pra frente e nos mudamos para São Paulo, onde nasceu minha irmã caçula, Nádia.
Inicialmente, ficamos hospedados na casa do tio Abrão, irmão da mamãe. Depois, papai alugou uma casa na Dona Avelina, uma rua íngreme, de terra. No final dela, havia uma mina d’água, onde eu buscava água com tia Halul. Levava um jarro pequeno, enquanto ela enchia uma lata de 18 litros que carregava nos ombros.
Nessa casa, fiz uma ‘arte’ que me rendeu um desvio na espinha. Aproveitei a ausência dos meus pais para brincar de balanço no varal de roupas. Subi em cima da nossa mesa de refeições, situada numa área externa, ao lado da cozinha, e pulei. O varal arrebentou, pois não aguentou meu peso. Ao cair de costas, fiquei até sem ar. Mas mamãe nunca soube do acontecido.
Logo, nos mudamos para a Rua Neto de Araújo, também na Vila Mariana. Gostava muito de ler, principalmente, revistas em quadrinhos. Uma vizinha tinha uma grande biblioteca e me emprestava os livros infantis da Coleção Melhoramentos.
Nesta casa, havia uma despensa. A janela descortinava uma ampla paisagem urbana. Dali, costumava fazer reflexos no ar com um pedaço de espelho. De um ponto desconhecido, alguém me respondia da mesma forma. Fiz isto muito tempo, tentando adivinhar quem era a pessoa do outro lado.
Fui estudar no Colégio Oriental, numa travessa da Avenida Paulista. Papai conhecia Salomão Yázigi, o diretor, com quem fez um acordo: se conseguisse dois alunos para a escola, recém-criada, eu poderia estudar de graça. E assim foi.
Fiz um ano de admissão e entrei para o 1º ano, que repeti por causa do Francês. No 2º ano, fui a melhor aluna da classe nessa matéria. Como eu era ruiva, meus colegas me apelidaram de cebolinha por causa das minhas tranças vermelhas.
O diretor era muito rigoroso, nenhum aluno gostava dele. Uma vez, bateu várias vezes com a régua em minhas mãos porque me encontrou fora da carteira, na sala de aula. Expliquei que levantei para pegar de volta a borracha que havia emprestado para um colega, mas não escapei do castigo.
A escola funcionava como semi-internato, mas eu almoçava em casa. Ia e voltava de bonde. À tarde tinha aulas de Árabe, junto com alunos de diversas idades. Coincidentemente, um aluno tinha o mesmo nome do meu irmão: Kaled Cury. Era boxeador. Um dia, seo Salomão, também professor de Árabe, ofendeu, verbalmente, este meu colega, que revidou com um murro na cara dele. Foi expulso da escola. Por falar em Árabe fluentemente, o diretor passou a me ver com mais simpatia.
O Parque Trianon, próximo à escola, estava sendo construído. Com meus colegas, Ayda Smit e Fuad Sawaya, eu matava aulas, à tarde, para subir numas pedras enormes usadas nesta construção. Também, ia às matinês do Cine Paraíso, adorava os filmes do Flash Gordon.
Uma vez, durante um almoço, caiu um mosquito no meu prato de sopa. Mamãe retirou o inseto e disse para eu continuar comendo. Como não obedeci, ela guardou a comida no prato, para o jantar. Só comi no almoço do dia seguinte, pois não agüentava mais de fome. Por ser a mais velha, mamãe foi muito rígida comigo.
Além do bar, papai vendia gravatas para as Casas Minerva, no Largo do Tesouro (depois, Largo do Correio). Em casa, mamãe cortava e costurava essas gravatas. Mas papai se desentendeu com o irmão, viciado em jogos, e decidiu vender o bar. Retornamos à casa dos meus avós, em 1941.
De volta às origens
Todas as tardes, no alpendre da casa, vovô costumava fazer aperitivos, geralmente, uma dose de pinga acompanhada de carne crua. Enquanto isto, minhas primas e eu ficávamos cantando em cima dos pés de caqui, no pomar do nosso avô. Também acompanhava meus irmãos para todo lado. Brincava com eles no Rio Guaxupé, no Bebedouro, e empinava pipas.
Depois, nos mudamos para a Avenida Conde Ribeiro do Valle, numa casa que tinha o chão de tábuas lavadas e fogão à lenha. O depósito de lenha ficava no porão. Com o tempo, apareceram fissuras no piso da casa. Por ali, começaram a entrar insetos e filhotes de cobras. No fundo do quintal, onde papai plantava muito milho, havia um brejo, formado por causa de um desvio que fizeram no percurso do Rio Guaxupé.
Fiz o propedêutico e o curso Técnico em Contabilidade na Academia de Comércio São José. Tinha apenas duas colegas, Lusbelina Alves e Maria da Glória, os demais eram homens. Lembro-me, com saudades, dos professores João Cândido, Dr. Artur Leão, Almo Saturnino e do sempre tão compreensivo seo Totó Eclissato.
Estava no 2º ano técnico quando representei a Academia no concurso de Rainha dos Estudantes. Heloísa Zerbini representou o Ginásio. Após a eleição haveria um baile. Na hora de conferir os votos, aconteceu um bafafá, uma briga muito feia que acabou com o meu sonho de ser rainha dos estudantes e com a festa.
Em 1944, recebi o diploma. Meu avô viajava pelo Brasil para celebrar batizados e missas. Voltava com muitos cortes de tecido que ganhava e dava de presente para as filhas e netas. Minhas tias, Fádua e Angelina, fizeram um vestido lindo para eu usar no baile de formatura. Estava quase pronto quando souberam que Tereza Buffoni, convidada para dançar a valsa com um dos formandos, havia feito um modelo igual. Fizeram outro, às pressas, para mim. Também ficou lindo, foi uma noite maravilhosa.
Quando me formei, seo Ítalo Russo me convidou para trabalhar no escritório da Papelaria Brasília. Um dia, chegando do trabalho, ouvi uma música. Quase desmaiei de felicidade quando entrei em casa e vi um rádio, meu sonho de consumo. Passei a ouvir música até altas horas, mesmo com as broncas da minha mãe.
Aprendi muito nesse escritório, mas fiquei poucos meses, pois mamãe adoeceu e precisei deixar o trabalho para ajudar em casa. Fiz amizade com Dirce Matos, grande e saudosa amiga, e Walquíria Russo, todas as duas minhas colegas na papelaria. Nós três fomos as primeiras mulheres a usar calças compridas em Guaxupé, num baile de Carnaval. Papai nunca soube deste fato, era muito rigoroso com os filhos. Mamãe era joia, acobertava a gente quando ele viajava a trabalho.
Minhas tias me ensinaram a bordar. Bordei muito para fora, fazendo crivo e sutache. Consegui juntar um bom dinheirinho, que emprestei ao papai. Ele só melhorou de vida ao começar a vender, na região, as Balas Imperial, fabricadas em Uberlândia: Eram uma delícia.
Um tempo depois, tio Jacob Sabbag pediu que papai me deixasse trabalhar, provisoriamente, no caixa do Bazar Avenida, em substituição a uma funcionária. Fiquei mais de um ano nesta função. Quando saiu a nota de mil cruzeiros, muito parecida com a de cem, cometi um equívoco: troquei uma pela outra, ao dar um troco. Tio Jacob foi muito compreensivo comigo, pois eu não tinha como pagar o prejuízo.
Namoro, batuques e casamento
Era muito amiga da Genoveva Saad. Por este motivo, fiz, também, amizade com o irmão dela, Sadalla. Em 1946, começamos a namorar. Íamos muito a bailes, gostávamos de dançar. Habitualmente, namorava dentro de casa. Quando ele começou um bloco de carnaval de rua com cerca de vinte amigos, entre eles, meu irmão Kaká, em 1947, juntei-me ao grupo. Havia somente três mulheres.
Por sugestão do meu irmão, o bloco foi batizado de Os Bicancas porque todos os componentes tinham narigões. O desenho do estandarte foi inspirado no Fadinho, um amigo do Sadalla, muito narigudo.
Ficamos noivos, em 49, nos casamos, em 1951. Em homenagem ao meu avô, já adoentado nessa época, vieram um bispo e um vice, de São Paulo, para celebrar nosso casamento, na Igreja Ortodoxa. Após nossa lua de mel, em Poços de Caldas, fomos morar com meus sogros.
Em 1952, nasceu nosso primogênito, Marcos Antônio. No ano seguinte, nos mudamos para uma casa na Rua Aparecida. Em 1956, nasceu nossa filha, Lidia Maria. Foi uma época muito boa. Aconteciam muitas festas na nossa casa, com muito samba e batuque. Nossos primos vinham de São Paulo para brincar os carnavais. Meu marido comprava caixas de lança-perfume Rodouro, que a gente espirrava uns nos outros.
Fui convidada para ser uma das ‘10 mais elegantes’ em um baile do Clube Guaxupé. Lula Thomaz fez parte da comissão que foi até minha casa fazer o convite. Também, tínhamos mesa cativa no Clube. Quando Isaac Elias foi presidente, ganhei um diploma de foliã mais animada e um prêmio em dinheiro. Desde 1965, quando nasceu nossa caçula, Sheila, já morávamos em casa própria, construída na Praça do Rosário, em frente à casa dos meus pais.
Com o passar dos anos, nosso bloco virou escola de samba. Chegou a ter mais de trezentos integrantes, a bateria, mais de cem. Nádia era porta-bandeira e Jorge Abrão, mestre-sala. Os Bicancas desfilaram e fizeram pré-carnavais em algumas cidades da região, como Poços de Caldas e São João da Boa Vista.
Uma vez, ao descer do ônibus, tropecei, e uma mulher que nos observava, falou: já chegou bebum. Logo eu, que não bebia nada. Noutra feita, pisei no arco da fantasia e caí, ficando com as pernas para cima. Meu sobrinho, Wagner, me ajudou a levantar. Foi um vexame, nunca mais quis usar arcos. Desfilamos, pela última vez, em 1981.
Fiz várias excursões, para a Pousada do Rio Quente, Salvador, Sul do Brasil e Madrid, na Espanha. Passamos vários carnavais no Rio de Janeiro, em excursões com o amigo André Calicchio. Numa destas viagens, Nádia, Lidia Maria, Marília Gonçalves e eu desfilamos na Unidos da Tijuca. Foi uma realização.
Participei muito da vida escolar dos meus filhos, estudava com eles para as provas. Também, sempre gostei de escrever. Colaborei com os jornais Coreto e Atitude. Escrevi crônicas para 23 edições da revista Atitude Interior.
Um dos meus maiores prazeres é caminhar, comecei há mais de quarenta anos. Apanhei muita chuva, caminhando. Até hoje, caminho por uma hora com minha filha caçula. Meu passatempo é fazer palavras cruzadas e ler romances. Ainda, participo do Viralatas do Samba, não posso deixar a peteca cair.”
Este vai ser o quarto ano da Lorice com o Viralatas do Samba. Muito participativa, faz sugestões para as fantasias e colabora na confecção dos adereços. Foi grande fonte de inspiração para o desfile de 2011. Ainda, ajuda sua filha na revisão desta coluna semanal com dicas preciosas. Sua força e alegria são um grande exemplo para toda a família: tem seis netos, mais Manuela e João Lucas, bisnetos.
Fotos:
1) Lorice no baile de formatura da Academia, em 1944.
2) Lorice e Sadalla Saad: casamento em 08.10 de 1951.
3) No carnaval de Os Bicancas, em 77, com a fantasia Sacerdotisa do Templo.
4) Em 2001, Lorice, entre os filhos Lidia Maria, Sheila e Marcos.
5) Recentemente, com as irmãs, Nádia e Fátima.
6) No desfile da Unidos da Tijuca, no Rio, em 1995.
Patrocínio Minha História:
Desculpe, caro leitor (a), pelo atraso, mas o trabalho foi grande, nas últimas semanas, E a ressaca, enooorme!
Comentários
Gostaria de agradecer os elogios ao meu texto.Porém, cabe esclarecer com relação as fotos da parte externa da Casa da Vó Maria.A imagem mostra que ali era o único local que estava acontecendo algo no carnaval.Era a única luz que havia na cidade.E foi esta também a intenção das fotos.
Outro ponto importante de ser ressaltado é que as fotos são enviadas ao editor do site e é ele quem seleciona e posta as imagens.
Portanto, gostaria de deixar claro , assim como está nos outros textos que enviei ao Gxp, que o brilho do carnaval de Guaxupé esteve nos blocos e nas escolas .O elogio aos ViraLatas e a todas as outras agremiações está nos textos de cobertura do carnaval do site Gxp.
Parabéns a todos dos ViraLatas que realmente só merecem elogios pela iniciativa que a cada dia só se fortalece e amadurece ainda mais.